UMA HISTÓRIA COM 150 ANOS

Portugal foi dos primeiros países do mundo a legislar sobre o domínio hídrico. Isto quer dizer que, desde 1864, por decreto real de D. Luís, Portugal passou a ter uma orla costeira e margens de rios que são propriedade pública. Mas daí até à realidade a coisa demora o seu tempo normal para tudo ser esclarecido.

Passados 150 anos, os ditos proprietários de zonas costeiras e de margens de rios, se quiserem manter essa propriedade intacta, têm de provar que antes de 1864 esses terrenos já eram privados e que foram sendo passados de geração em geração. De acordo com a legislação, pertencem ao Estado todos os terrenos situados numa faixa de 50 metros do mar, a contar da preia-mar da maré mais alta do ano e de 30 metros das margens dos rios. Quem quiser contrariar esta realidade terá de recorrer aos serviços de advogado para justificar em tribunal a sua propriedade, mas antes deve consultar um historiador, pois recuar mais de 150 anos não é tarefa para qualquer indivíduo.

Tudo isto, que foi criado há 150 anos, ficará definitivamente encerrado no final deste ano. Há quem se movimente para contrariar a legislação e no caso açoriano é o próprio Governo Regional que procura uma saída legal para contrariar a lei, justificando que a Região tem especificidades próprias quanto à ocupação do território.

Portugal tem uma orla costeira com 1.793 quilómetros, incluindo Açores e Madeira. Cerca de um terço ainda é propriedade privada. Há países que consideram que os espaços costeiros e junto aos rios devem pertencer a todos. Portugal está nesse caminho e, em breve, tudo aponta para que passear-se junto ao mar ou nas margens de um rio não seja impedimento por invasão de propriedade.

Mas mesmo que alguém ainda consiga provar a história do seu terreno antes de 1864, uma certeza existe pela legislação recente: os planos de ordenamento da orla costeira inviabilizam qualquer tipo de novas construções junto ao mar. Com estas medidas protegem-se as zonas costeiras mais afetadas pela erosão e ao mesmo tempo, as águas dos rios também ficam mais controladas pelo domínio público.

Direitos individuais ou direitos públicos é uma discussão que se vem arrastando, cujo desfecho está à vista. Demorou 150 anos e, por isso, a coisa está pacífica.

A Direção