A MULHER QUE CANTOU A ALMA DOS PORTUGUESES

Correio da Manhã Canadá

Faz este mês 100 anos. Amália, a mulher portuguesa que espalhou o fado nos quatro cantos do mundo, nascia a 1 de julho de 1920, sendo apenas registada dias depois, como nascida às cinco horas de 23 de julho na rua Martim Vaz, na freguesia lisboeta da Pena.

De uma família humilde e numerosa, Amália chegou a trabalhar como bordadeira, engomadeira e tarefeira. A extensão fenomenal da sua voz, aliada a um timbre único e à beleza nostálgica e sonhadora, acabariam, no entanto, por convertê-la na revelação do fado, um talento internacional equiparável ao de Edith Piaf, em França, ao de Carlos Gardel, na Argentina, ou ao de Frank Sinatra, nos Estados Unidos. A voz de Portugal.

Mas Amália Rodrigues nem sempre foi uma figura consensual. Se por um lado era acusada de estar ao serviço do Estado Novo, por outro também sofreu pressões da PIDE, a polícia política da ditadura, por suspeita de apoio aos comunistas. Vários testemunhos sustentam a ideia de que Amália apoiou por diversas vezes, com dinheiro, portugueses exilados, protegeu amigos antifascistas e tentou influenciar a libertação de presos políticos, nomeadamente de Alain Oulman, o compositor com quem colaborou nas décadas de 1960/1970.

Passadas as vicissitudes da história, Amália é hoje lembrada com as honras de um símbolo de Portugal. Sepultada no Panteão Nacional, entre outras personalidades ilustres, a rainha do fado consagra a identidade portuguesa, nos seus elementos mais patrióticos, como a nostalgia ou a saudade, que tanto cantou.

O universo afetivo da nostalgia e da saudade – central para as comunidades imigrantes – talvez seja o que mais a aproxima dos luso-canadianos. Na procura da preservação do ADN português, Amália é uma grande aliada, uma fonte de orgulho e de sentimento de pertença. 100 anos depois do seu nascimento, continua a inspirar tributos, nomeadamente em Montreal, onde é finalizado, no dia 23, um dos 25 murais alusivos a Amália que o luso-canadiano Herman Alves pretende erguer em vários países, como se pode ler na página 8 desta edição impressa.

Neste ano do centenário da rainha do fado, vale a pena lembrar que Amália não cantou só a alma de Portugal, mas também a de todos os portugueses espalhados pelo mundo.