
Lisboa, 14 jul 2025 (Lusa) — O movimento Vida Justa acusa a Câmara Municipal de Loures de impedir o acesso ao direito dos moradores do bairro do Talude Militar cujas casas foram demolidas hoje, avaliação apoiada por um advogado especialista em Direito Administrativo.
Os moradores de 64 habitações precárias autoconstruídas do bairro do Talude Militar, onde vivem 161 pessoas, foram notificados sobre as demolições pela Câmara de Loures na sexta-feira, às 19:00, findo o expediente judicial.
Essas notificações deram início ao prazo de 48 horas fixado na lei para permitir que as pessoas possam aceder aos tribunais para defesa de direitos e interesses legalmente protegidos.
Ora, correndo esse prazo no fim de semana, tal não foi possível, conclui, em declarações à Lusa, um elemento do movimento Vida Justa que está a apoiar os moradores em risco de verem as suas casas demolidas.
Este mesmo elemento considera que se está perante “uma tentativa de impedir o direito constitucional à tutela jurídica”.
Esse direito está consagrado no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa e garante o acesso ao direito e um processo equitativo.
Ainda que nestas circunstâncias, pelo menos uma advogada conseguiu interpor uma providência cautelar dentro do prazo de 48 horas, abrangendo 14 moradores — que, porém, só hoje terá sido recebida por um juiz, quando os tribunais regressaram ao funcionamento.
Porém, a autarquia de Loures deu início à operação de demolição de habitações no Talude Militar antes dessa hora, pelas 08:00 de hoje –, ainda que só se viesse a efetivar mais de duas horas depois, face à resistência dos moradores, que dificultaram a intervenção policial que a acompanhava.
A notificação feita pela autarquia socialista leva João Gaspar Simões, advogado especialista em Direito Administrativo, a considerar que existiu “uma intenção maliciosa de coartar a capacidade de recurso” à tutela jurisdicional efetiva.
“É manifestamente uma atuação que pretende retirar as garantias de defesa administrativa e jurisdicional que a Constituição assegura aos cidadãos”, explicita, apoiando-se também nos artigos 266 a 268 da Constituição, que dizem respeito às garantias administrativas.
A autarquia de Loures — sublinhou o advogado –, “impediu, desde logo, o recurso para o próprio órgão que pratica o ato e a impugnação administrativa do ato, porque os serviços da câmara estão fechados ao fim de semana”.
Durante a operação de demolição realizada hoje no bairro, vários moradores queixaram-se de terem sido notificados apenas na sexta-feira para algo que viria a acontecer na segunda-feira.
À Lusa, Paula Magalhães, vereadora da Câmara Municipal de Loures que tutela a polícia municipal, confirmou que os moradores em causa foram notificados “na sexta-feira”.
Questionada sobre o facto de esse período impossibilitar o recurso ao sistema judicial para contestar a decisão, respondeu: “Pronto, mas [durante o fim de semana] têm tempo para fazer a retirada das suas coisas, que é o objetivo da notificação.”
Vários moradores relataram ainda que nunca foram contactados pelo executivo municipal, apesar de terem feito pedidos de reunião.
A vereadora Paula Magalhães considera, porém, que “não existe essa necessidade” de falar previamente com as pessoas que moram em casas que vão ser demolidas.
A operação de hoje no Talude Militar, “sob o comando da Câmara Municipal”, não foi a primeira, nem será a última, adianta, alargando a intenção de demolição a outros bairros do concelho, sem especificar.
“A Câmara Municipal de Loures não permitirá a construção e a continuidade da construção desta realidade que são as barracas no concelho de Loures”, vincou.
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