UM DIA DE CADA VEZ

Correio da Manhã Canadá

Os dias passam e o cenário não só se mantém, como se agrava. Mais casos, mais mortes, mais regras, mais despedimentos, mais incentivos, mais tédio, mais horas em casa… Vivemos dias que se caracterizam pelo rodopio do “mais” e nem sempre é fácil pôr esta crise, provocada por um vírus, em perspetiva.

Por outro lado, perspetivar a pandemia da COVID-19 é um exercício que se impõe. Na edição de hoje, numa entrevista feita a Ana Bailão, vice-presidente da Câmara Municipal de Toronto, abordamos a importância de relativizar a crise atual, mas também do civismo individual – que se traduz no isolamento –imprescindível à resolução rápida do problema.

“São tempos nunca vividos” diz a autarca luso-canadiana, “mas quem passou por guerras talvez já tenha vivido situações mais difíceis”. A nós, cabe-nos ficar na segurança das nossas casas e, quem sabe pela primeira vez, tirar partido da morosidade do tempo, que tantas vezes acusamos de ser demasiado rápido e implacável.

No século 17, Blaise Pascal dizia que “todos os problemas da humanidade decorrem da incapacidade de o homem ficar tranquilamente sozinho sentado no seu quarto”. As palavras do filósofo e matemático francês surpreendem – para não dizer sobressaltam – pela intemporalidade e pela incisiva pertinência nos dias que correm.

Ninguém gosta de estar “sozinho sentado no seu quarto”, porque isso significa encarar, sem distrações, as próprias fragilidades, medos e angústias. Mas o isolamento não tem de representar solidão ou perda de oportunidades, mas sim a possibilidade de aceitar e de vestir bem a própria pele, para sermos capazes, depois, de vivermos em pleno, em comunidade.

Se pensarmos bem, a quarentena é isso mesmo: um tempo para aprendermos a estarmos connosco, para daqui a um mês, dois meses, três meses, sermos capazes de estar melhor com os outros, como tão bem expõe Tedros Adhanom, diretor da Organização Mundial da Saúde: “A COVID-19 está a tirar-nos tanto, mas também nos está a trazer algo especial: a oportunidade de aprendermos e crescermos, juntos”.