Timor-Leste/Eleições: Rogério Lobato diz que aos 73 devia descansar em vez de se candidatar a PR

Díli, 03 mar 2022 (Lusa) – Rogério Lobato diz que, aos quase 73 anos “deveria descansar”, mas que a situação “lamentável” e de instabilidade constante em Timor-Leste o levaram a decidir candidatar-se pela segunda vez ao cargo de Presidente da República.

“Tenho acompanhado a situação no país, uma situação lamentável de instabilidade, de fragilidade constante. E como um dos iniciadores deste processo, não posso ficar a ver e cruzar os braços”, disse Lobato, um dos 16 candidatos presidenciais, em entrevista à Lusa.

“Como dizem os sarauís, temos toda a morte para dormir. Até lá, enquanto houver vida devemos fazer alguma coisa para servir a nossa comunidade e a nação”, disse.

Num momento em que como nunca se debate a transição geracional e o fim do controlo da geração de 1974-1975, Lobato, um dos iniciadores do processo de luta pela independência timorense, considera que o papel de todos é necessário ao país.

“É verdade que estamos numa democracia e não podemos apenas viver das figuras históricas, mas isto é um país ainda em desenvolvimento, ainda novo, e as figuras históricas têm sempre um certo peso”, disse.

“Por isso penso que durante algum tempo este povo vai continuar muito ligado às figuras históricas”, sustentou.

Satisfeito com o que diz serem competências e capacidades na nova geração, Lobato considera que algumas das novas vozes políticas “já sabem pensar o país”, mas admite que as divisões se poderiam agudizar se os mais velhos saíssem do palco político já.

“Mesmo com essa geração, primeira ainda há tantos problemas e tantas divisões, o que será se não entregarmos um país em condições para a nova geração que vem a seguir pode fazer melhor uma gestão”, disse.

Na avaliação dos líderes históricos, são evidentes as visões opostas que tem sobre Mari Alkatiri, secretário-geral da Fretilin, partido em que militou, e Xanana Gusmão, líder do CNRT e de quem tem estado cada vez mais próximo.

“Há um líder que não controla a língua. Mari fala em querer juntar a geração de 75 mas começa a fechar a porta com as declarações que faz, como dizer que a aproximação com Xanana Gusmão é impossível. Se queremos de facto um entendimento, temos que controlar o que dizemos, porque a palavra tem força”, disse.

Lobato responsabiliza Mari Alkatiri “pela situação”, refere que “tem dito tanta coisa” sobre Xanana Gusmão e que este “não tem aberto a boca uma única vez para lhe responder” e considera que a diferença de ideias é normal mas que o líder da Fretilin “continuar a tentar convencer que o que ele diz é a verdade de Timor-Leste”.

E critica o facto de Alkatiri liderar o partido há duas décadas, sem querer alternância na liderança, num momento em que “é preciso pensar a Fretilin de outra forma”, voltando a “abrir o partido como o fez Nicolau Lobato” e como ocorreu durante a luta armada, “abrangendo todas as tendências no partido”.

Ainda assim nota que o novo ‘pacote’ do ex-primeiro-ministro Rui Araújo e do deputado José Somotxo, que querem desafiar a liderança da Fretilin, está “a causar muitas movimentações internas”, algo que se consolidou com a candidatura a Presidente de outro histórico do partido, Lere Anan Timur.

“Há muita esperança das pessoas na figura do Lere. Não sei se passará nestas eleições, mas ele é um membro declarado da Fretilin e se não passar nesta corrida, poderá ser uma figura aglutinadora dentro da própria Fretilin, porque vem da luta e tem certo peso”, considerou.

E insiste na comparação entre os dois líderes históricos.

“Não coloco no mesmo plano o Mari Alkatiri e Xanana Gusmão. Este último tem peso político muito maior. Mari só tem peso por ser o secretário-geral da Fretilin, serve-se da Fretilin como pedestal para se tornar visível”, afirmou.

“Xanana foi continuador do Nicolau Lobato e sabemos bem o que fez em períodos muito difíceis. Tornou a resistência mais abrangente, fez a aproximação com a igreja, despartidarizou as Falintil e a luta e isso foi uma iniciativa extraordinária, fundamental. Isto foi obra do Xanana, que passou as privações no mato, as humilhações de ter sido capturado. Não os podemos colocar no mesmo plano”, vinca.

Lobato nunca esteve longe da polémica. Durante a ocupação indonésia esteve preso durante seis anos em Angola por tráfico de diamantes, que explicou no passado pretender financiar o envio de armas para Timor-Leste e foi ministro da Defesa e do Interior depois da restauração da independência.

Em 2006, quando o país esteve próximo de uma guerra civil, voltou a ser condenado por armar civis, explicando à Lusa numa entrevista alargada em 2015 que foi usado “como bode expiatório” e que fez o que fez para defender o Governo.

A campanha eleitoral decorre até 16 de março, realizando-se as eleições no dia 19.

 

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Lusa/FIm