PR cabo-verdiano alerta para riscos de judicializar a política e politizar a justiça

Praia, 23 dez 2025 (Lusa) — O Presidente cabo-verdiano alertou hoje para os riscos de “judicializar a política” e “politizar a justiça”, cerca de uma semana após buscas do Ministério Público à Câmara da Praia, capital do arquipélago, que geraram críticas.

“Os partidos políticos e os dirigentes têm de reaprender a discordar, ser leais à Constituição e garantir que tudo funcione de acordo com as regras do país”, afirmou José Maria Neves, após ser questionado pelos jornalistas sobre as buscas do Ministério Público na Câmara Municipal da Praia (CMP).

O chefe de Estado acrescentou que cabe sobretudo aos partidos e aos atores políticos “não judicializarem a política, para evitar a politização da justiça e a fragilização das instituições e do Estado de Direito Democrático”.

“Apelo à serenidade e ao debate. Não há nenhuma crise institucional”, disse, frisando ser necessário garantir que a investigação decorra “de forma transparente e abrangendo todos de igual forma”.

“Nós temos de ser leais à Constituição, que prevê a separação dos poderes, a independência dos tribunais e a autonomia do Ministério Público. É preciso respeitar as decisões dos órgãos de soberania. Ninguém está acima da lei. As pessoas e as instituições podem contestar decisões dos tribunais ou do Ministério Público, mas têm de o fazer nos espaços próprios”, acrescentou.

Há cerca de uma semana, a Procuradoria Geral da República (PGR) anunciou que o Ministério Público realizou buscas na Câmara Municipal da Praia e ordenou a apreensão de terrenos.

As buscas foram realizadas no âmbito de “novas denúncias” por suspeitas de “crimes de falsificação de documentos, participação ilícita em negócio, defraudação de interesses públicos patrimoniais e corrupção ativa e passiva, relacionadas com a dação em cumprimento do terreno Complexo Babilónia, na zona da Prainha, e de outros cinco situados na Cidadela e no Palmarejo Grande”.

Durante as buscas, em vários locais da Câmara, apenas nos Paços do Concelho as portas estavam fechadas e os funcionários ausentes, pelo que o magistrado do Ministério Público mandou arrombar um portão lateral, permitindo o acesso ao gabinete do presidente, onde foram apreendidos documentos.

O Ministério Público ordenou também a apreensão dos terrenos do Complexo Babilónia e de outros cinco imóveis, que já tinham sido alvo de acusações do Movimento para a Democracia (MpD, poder) contra o presidente da Câmara da Praia, Francisco Carvalho, sobre a alegada venda irregular de imóveis do Estado.

Francisco Carvalho, eleito pelo Partido Africano da Independência de Cabo Verde (PAICV, o mesmo que elegeu José Maria Neves como chefe de Estado), acusou a Procuradoria-Geral da República de agir “contra a justiça” e apelou à alteração da Constituição.

O autarca acusou ainda a Procuradoria-Geral de estar a agir a mando do MpD.

O primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva, reagiu às buscas, afirmando que as instituições judiciais atuam com total independência e que o Governo não interfere no seu funcionamento.

O caso tem motivado reações de partidos políticos, da Ordem dos Advogados, de juristas e de outros atores.

De acordo com o jornal A Nação, Francisco Carvalho foi constituído arguido pela Procuradoria-Geral da República em relação às buscas, mas faltou à audiência prevista para segunda-feira, alegando ter viajado para Lisboa na madrugada de sábado e que tinha solicitado previamente o adiamento por já ter a deslocação programada.

 

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