O QUE FAZEMOS PELOS OUTROS

O voo Lisboa Toronto atrasou alguns minutos porque o check-in demorou mais tempo do que o previsto. O avião vinha completo, cheio de gente, de bagagem e de esperanças. Lá dentro vinha o Fernando, um português de 42 anos, nascido e criado em Barcelos e que tinha viajado à pressa até Portugal para enterrar a mãe acabada de morrer.

Toda a vida foi canalizador. Casado há 20 anos e com dois filhos, de 16 e 8 anos, viu a sua situação piorar nos últimos dois anos. Como qualquer português, foi convidado a comprar casa há alguns anos atrás. Assinou tudo o que lhe apresentaram e quando se viu sem trabalho foi avisado da responsabilidade assumida. Como é homem de palavra tinha que arranjar maneira de cumprir e de defender a honra da casa.

Há dois anos ganhava cerca de 700 euros por mês. Não era suficiente. Barcelos começava a ser um problema e não um modo de vida. Então falou com um cunhado que vivia em Toronto e sozinho partiu à procura de melhores dias. Neste momento, vive em Vancouver, mais longe da sua família do que poderia imaginar. Mas não havia outra alternativa…

Trabalha na construção, de sol a sol. Faz jornadas de 10 e 12 horas. Ganha por hora 35 dólares, tem que fazer compras, cozinhar, tratar da roupa e demais trabalhos domésticos. Neste verão pensa voltar por duas semanas para matar saudades da mulher e dos filhos. Depois será regressar ao Canadá para ganhar o suficiente para alimentar a sua estrutura familiar e mais importante que tudo, não deixar de pagar a casa.

Maldita sina. Trabalha muito, vive como pode e não está com a família que ocupa a dita casa de Barcelos. Encontrou neste modo de vida a melhor forma para resolver o problema. A única saída é trabalhar e ganhar no Canadá por semana mais do que ganhava em Portugal num mês.

O Fernando desabafou que agora compreendia melhor o seu Portugal. Se lá trabalhassem metade do que eu faço aqui, tudo seria diferente. Mas a vida tem destas coisas. No Canadá tem contrato de trabalho até 2014. Até lá, há que comportar-se bem para não ter problemas com a emigração. Nos dias que não trabalha não ganha. Nas férias desfruta de algum dinheiro que lhe é entregue pelo seu sindicato. Sim, porque é o sindicato que assume essa responsabilidade. A isso, o Fernando chama “subsídio de férias”. E como diz, fazemos nos países dos outros aquilo que recusamos fazer no nosso.

A Direção