Ex-guerrilheiros da moçambicana Renamo frustrados com processo de desmobilização

Beira, Moçambique, 26 out 2023 (Lusa) – Dezenas de ex-guerrilheiros da Renamo, principal partido na oposição moçambicana, queixaram-se hoje, na cidade da Beira, do incumprimento na fixação e pagamento das pensões e apoios previstos no processo de Desarmamento, Desmobilização e Reintegração (DDR).

“Há promessas que não estão a ser cumpridas desde que nós saímos das matas. Por exemplo, teríamos direito a casa, pensão de sobrevivência e muitas outras coisas, que não estão a ser cumpridas pelo Governo, nem pelo presidente da Renamo”, afirmou Joaquim Catanda, ex-guerrilheiro da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo), em representação da antiga base de Inhaminga.

Em causa está a insatisfação transmitida hoje por parte dos mais de 250 desmobilizados da Renamo das antigas bases da Gorongosa e Inhaminga que passaram à vida civil, contestação que ganhou um novo tom de insatisfação por muitos deles acreditarem que o regresso às matas será a solução para os seus problemas.

Joaquim Catanda admitiu que alguns ex-combatentes daquela força admitem esse regresso às matas caso o acordo continue a falhar, havendo, inclusive, queixas de diferenças face aos pagamentos anteriormente acordados neste processo.

Além de atribuição de talhões para construção em áreas urbanas, os ex-guerrilheiros recordam que também deviam receber kits de ferramentas e fundos para desenvolver projetos de geração de renda nas respetivas áreas de vocação.

Outro ex-combatente, da base da Gorongosa, Felisberto Jone, contou que parte destes “venderam o material de construção entregue durante a desmobilização” para conseguirem sobreviver com as famílias nas cidades.

“Na altura do DDR as promessas foram vastas, prometeram-nos bairro militar, casas e muitas outras coisas, mas nada disto estamos aqui a ver. Estamos cansados de vivermos de biscates para sobreviver, por isso, a nossa escolha é voltar às nossas matas e pegar enxada para produzirmos comida como fazíamos antes”, observou.

“Preferimos voltar nas matas para procurarmos maneiras de como viver”, acrescentou.

No passado dia 04, o Presidente moçambicano anunciou que os primeiros 27 guerrilheiros dos 5.221 desmobilizados pela Renamo começaram a receber pensões do Estado moçambicano em setembro, no âmbito do processo de Desmilitarização, Desarmamento e Reintegração.

“Com o início deste processo, deixamos claro que não há dúvidas sobre o compromisso do Governo nem motivos para o retorno às armas”, afirmou, em Maputo, o chefe de Estado, Filipe Nyusi, durante a cerimónia do 31.º aniversário do Acordo Geral de Paz, assinado entre a Renamo e as autoridades moçambicanas.

“Dos 5.221 abrangidos até ao momento, foram formados 1.756 processos, dos quais 440 estão devidamente instruídos, 316 pensões fixadas, 251 com visto administrativo e, destas, 27 beneficiários já receberam as suas pensões em setembro passado. Os restantes receberão as suas pensões no corrente mês de outubro e assim em diante”, avançou, na mesma intervenção.

O Acordo Geral de Paz de 1992 colocou fim à guerra dos 16 anos, opondo o exército governamental e a guerrilha da Renamo. Foi assinado em Roma, entre o então Presidente Joaquim Chissano e Afonso Dhlakama, líder histórico da Renamo, que morreu em maio de 2018.

Em 2013 sucederam-se outros confrontos entre as partes, que duraram 17 meses e só pararam com a assinatura, em 05 de setembro de 2014, do Acordo de Cessação das Hostilidades Militares, entre Dhlakama e o antigo chefe de Estado Armando Guebuza.

Já em 06 de agosto de 2019 foi assinado o Acordo de Paz e Reconciliação Nacional, o terceiro e que agora está a ser materializado, entre o atual Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, e o líder da Renamo, Ossufo Momade, prevendo, entre outros aspetos, a Desmilitarização, Desarmamento e Reintegração (DDR) do braço armado do principal partido de oposição.

“O processo de Desmilitarização, Desarmamento e Reintegração é corolário de um longo processo de diálogo que abraçamos como única via eficaz para alcançar a paz. Neste momento, em que comemoramos o Dia da Paz, saúdo o povo moçambicano pelo facto de a paz ter passado a fazer parte da nossa cultura”, afirmou ainda o chefe de Estado, nesta intervenção.

O processo de DDR, iniciado em 2018, abrange 5.221 antigos guerrilheiros da Renamo, maior partido da oposição moçambicana, dos quais 257 mulheres, e terminou em junho último, com o encerramento da base de Vunduzi, a última da Renamo, localizada no distrito de Gorongosa, província central de Sofala.

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