ENTRE BLOQUEIOS INDÍGENAS, UM PRIMEIRO-MINISTRO PARALISADO

Correio da Manhã Canadá

“Somos um país criado pela imigração, de todos os cantos do mundo. Desde o início, ser canadiano é ser um conjunto de identidades muito diferentes, sem prejuízo de momentos terríveis de intolerância e de racismo no nosso passado. Ainda hoje, há desafios profundos na reconciliação com as comunidades indígenas.”

As palavras são de Justin Trudeau, na reta final de uma viagem por África, o Médio Oriente e a Europa. Enquanto, numa conferência internacional na Alemanha, o primeiro-ministro falava sobre o ADN multicultural do Canadá, as dores coloniais do passado e os desafios de reconciliação ainda existentes no país, do outro lado do Atlântico, notícias sobre a onda de protestos contra o gasoduto em British Columbia continuavam – e continuam –, teimosamente, a invadir o espaço mediático.

Têm sido dias agitados no país, assistidos à distância pelo primeiro-ministro do Canadá. Como era de esperar, a viagem da semana passada já lhe rendeu fortes críticas de inércia por parte da oposição, culminando até no cancelamento de uma outra visita, agendada para esta semana, às Caraíbas.

Há quem diga que tudo o que Trudeau menos quer é envolver-se no embate entre os opositores do gasoduto que atravessa território indígenas. O conflito é contrário à marca que tem vindo a construir, assente numa imagem de pacificação com as “Primeiras Nações”, e será por essa razão que tem faltado firmeza às suas intervenções no que toca a este assunto. Por outro lado, a distância geográfica já não serve de pretexto para não encarar o problema. Entre relatos diários de detenções, bloqueios de estradas e linhas ferroviárias, cancelamentos de comboios e invasões de escritórios de membros do governo federal, Trudeau terá mesmo de encontrar uma solução – ou, pelo menos, esforçar-se por ela – e de mostrar que é um líder capaz de desfragmentar o país.

O cancelamento da viagem às Caraíbas e a reunião de urgência realizada esta segunda-feira no âmbito dos bloqueios ferroviários poderão ser os primeiros sinais da liderança de Trudeau que está a faltar. Na análise da abordagem do atual primeiro-ministro, há até quem se refira à postura do pai, Pierre Trudeau, no que toca à “Crise de Outubro” em 1970, como sendo exemplar e potencialmente inspiradora para o filho.

É hora de ficarmos atentos ao desbloqueio dos protestos e do próprio primeiro-ministro canadiano.