‘Badjias’ resistem a crises sociais e alimentam famílias em Maputo

Manhiça, Moçambique, 23 dez 2025 (Lusa) — Lina Machava, vendedora de ‘badjias’ na Manhiça, espera “fazer dinheiro” este Natal vendendo os pastéis nas bancas improvisadas que resistiram aos protestos pós-eleitorais, negócio que alimenta famílias que fogem ao desemprego naquele distrito da província de Maputo.

Aos 52 anos, os últimos seis a confecionar e a vender estes pastéis, de inspiração indiana e populares em Moçambique, à base de farinha de feijão nhemba e servidos no pão, explica à Lusa que o negócio, na Manhiça, a cerca de 80 quilómetros a norte da cidade de Maputo, “não tem tempo” e rende todo o ano, cada uma vendida a 2,5 meticais (0,03 cêntimos).

Ainda assim, cresce com as festas do final do ano e com o forte movimento na estrada, ou não fosse a localidade um ponto de passagem obrigatório para quem assinala as festas fora da capital.

Mãe de três filhos, acorda todos os dias às 05:00 para, no seu alguidar, misturar o feijão nhemba, o alho, a cebola, o sal e a cebolinha “de folhas frescas”, e depois fritar as ‘badjias’. Duas horas depois estão à venda na esquina da sua casa, numa banca precária, improvisada. Antes das 12:00 o negócio está feito e já pode regressar a casa com o rendimento do dia, de cerca de 300 badjias.

A vendedora conta que espera o resto do ano por este período de festas para aumentar a vendas destes salgadinhos na rua: “é o tempo que mais vou fazer dinheiro”.

O marido ficou sem trabalho e Lina confia nos pastéis, que lhe rendem quase 2.000 meticais (27 euros), para ajudar em casa.

“Compensa, sim. Dá para sustentar”, frisa Lina, sobre o negócio e o seu lucro “razoável”, que tenta juntar para comprar um saco de feijão por 2.500 meticais (34 euros).

O negócio em torno destes pastéis ganha palco nas ruas e espaços centrais da Manhiça, além dos subúrbios da cidade de Maputo, numa concorrência dominada maioritariamente por mulheres que fogem ao desemprego, conquistando clientes, desde o informal ao executivo – que buscam, antes de começar a trabalhar, satisfazer a fome com o popular ‘matabicho’.

“A dona Lina faz boas ‘badjias'”, diz à Lusa Aurélio, 24 anos, um dos fiéis clientes, enquanto procura ‘matabichar’, acompanhando com chá.

No coração da Manhiça, junto à estrada Nacional 1 (EN1), fica o mercado Nwancacana, onde, a menos de 300 metros de Lina, numa das principais entradas, Azerda Joaquim, 44 anos, montou a sua banca. É ali que faz e vende as ‘badjias’ há 23 anos, usando a higiene para conquistar os clientes.

“Isso requer a higiene, a forma como a pessoa prepara. Então, eu como estou ciente de fazer esse trabalho, faço por gostar e ver que dá benefício para mim”, diz à Lusa Azerda, já com o fogão a carvão aceso para, pela segunda vez no dia, colocar as ‘badjias’ a fritar.

De rosto queimado pelo calor do fogão, Azerda ainda se ressente, um ano depois, dos tumultos que se seguiram às eleições de outubro do ano passado, com morte, destruição e negócios parados em todo o país.

“Não havia como parar. (…) isso é a minha base, [é] o meu sustento”, recorda, triste pela situação.

Hoje pede ajuda para o negócio a uma amiga, que vende pão, o complemento para as ‘badjias’. Tenta também apanhar os clientes nos comboios que passam aos sábados e domingos na maior estação distrital da zona.

Diz-se ainda ansiosa pelos dias das festas, Natal e passagem de ano, para sentir o consolo dos clientes que ali se deslocam para apreciar as suas ‘badjias’, servidas naquele movimentado mercado. Ainda assim, garante: “independentemente de haver Natal ou não, eu sempre vou fazer”.

“É um produto que me dá o valor mais rápido”, conta, sobre a principal fonte de sustento, que lhe rende pelo menos 400 meticais [5,48 euros] em cada caneca de feijão-nhemba.

Com apenas ingredientes de baixo custo, assegura garantir o suficiente para alimentar os cinco filhos e sustentar a banca que agora complementa com a venda de tomates, cebolas e chá.

“Significa que me dá lucro, (…) há vezes que faço 3.000 a 3.500 [meticais, 41 a 48 euros] depende da quantidade [do feijão]”, conta.

Já Susana Bila, 62 anos, trabalha sem banca fixa, vivendo de ‘mbenga’ — alguidar no qual faz os pastéis de ‘badjias’ há oito anos -, e da ida à ‘machamba’ (campo agrícola). Recorda que se iniciou no negócio quando passou dificuldades que se agravaram também com a reforma do marido.

“Comecei depois, por ver que estava a ficar mal, tirei a cabeça, [a pensar] se fizer assim [vender ‘badjia’] a coisa pode sair para me alimentar”, recorda à Lusa, enquanto tira do fogareiro adaptado com tijolos a primeira fornada de pastéis.

Susana também se ressentiu dos protestos pós-eleitorais.

“Nenhuma coisa saiu, [tudo] saiu negativo, mas, nem com isso, a vida para”, assegura Susana, lembrando que recorreu à sua ‘machamba’ para fazer negócio. Por agora, o tempo é de esperar pelos clientes em época de Natal: “Espero continuar, porque se eu não continuar, ficar parada, ninguém vai-me dar sal, enquanto os meus filhos não estão a trabalhar”.

No resto do ano os pasteis rendem-lhe num dia quatro euros. Com as festas à porta, espera mais negócio, mantendo um segredo na preparação da ‘badjia’: “Só ponho sal, cebolinha, cebola e alho. Assim vou preparar, vou fritar sem pôr água. Só com aqueles ingredientes, já facilita para a ‘badjia’ ficar fortificada”.

Por agora resta esperar pelos dias das festas, quando o negócio das ‘badjias’ recebe fôlego extra, juntamente com as famílias que dele dependem.

 

VIYS // VM

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