
Lisboa, 28 out 2025 (Lusa) – A ex-gestora bancária do empresário Carlos Santos Silva confirmou hoje em tribunal que este ordenou transferências para a esfera de José Sócrates, tendo chegado a reportar a compra de uma casa à mãe do antigo primeiro-ministro.
Na sessão de hoje do julgamento do processo Operação Marquês, a ex-gerente de conta de Carlos Santos Silva no Banco Espírito Santo (BES) testemunhou que, a certa altura, estranhou uma transferência de “centenas de milhares de euros” para um beneficiário que não conhecia, com “um descritivo/justificativo muito extenso”, que assinalava tratar-se do “sinal de compra e venda de um imóvel”.
“Eu não conhecia o beneficiário da transferência e fui ao Google, inseri o nome [Maria Adelaide Monteiro] e vi que era a mãe do engenheiro José Sócrates. E aí eu fui participar”, contou Ana Vaz, acrescentando que também a deixou alerta o facto de o empresário não ter comunicado previamente que o movimento financeiro iria ter lugar.
Na acusação do processo Operação Marquês, o Ministério Público defende que em causa está dinheiro que pertenceria na realidade a José Sócrates e que o negócio da casa, localizada em Lisboa, foi uma das formas encontradas para o chefe de Governo entre 2005 e 2011 ter acesso aos fundos, alegadamente com origem em corrupção.
No testemunho de hoje, Ana Vaz relatou também que Carlos Santos Silva disse que tinha uma amiga que queria comprar um monte no Alentejo, tendo o empresário garantido o financiamento de 850 mil euros “com o penhor financeiro de um depósito a prazo de igual montante”, com autorização para débito em caso de a compradora não ter capacidade para pagar o empréstimo.
“Na altura, [o nome da beneficiária] não me dizia nada, mas, mais uma vez, fui ao Google e soube que Sofia Fava tinha sido casada com o engenheiro José Sócrates”, afirmou.
Ana Vaz confirmou ainda a remessa de cerca de dois mil euros mensais para Sandra Santos, uma mulher residente na Suíça que seria próxima do antigo primeiro-ministro.
Num depoimento durante o qual o advogado de José Sócrates, Pedro Delille, ameaçou abandonar a sala por ter sido chamado à atenção pelo tribunal por uma pergunta que fez, a bancária adiantou ainda que reportou também à sua direção o facto de Carlos Santos Silva pedir para que fosse um funcionário do banco a levantar cheques.
A este propósito, Ana Vaz salientou que, “a partir de determinada altura”, apercebeu-se da existência de “levantamentos da ordem dos 10 mil euros de uma maneira muito recorrente”, tendo questionado o empresário sobre a justificação para tal acontecer e obtido “uma resposta vaga, que [os montantes] eram para despesas”.
Na acusação, o Ministério Público considera que estes levantamentos em numerário destinar-se-iam igualmente a pessoas da esfera de José Sócrates.
Os atos sob suspeita ocorreram entre 2012 e 2014.
O antigo primeiro-ministro e Carlos Santos Silva, ambos de 68 anos, são dois dos 21 arguidos na Operação Marquês, aos quais o Ministério Público imputa, no total, 117 crimes económico-financeiros.
Os arguidos têm todos, em geral, negado a prática de qualquer ilegalidade.
O julgamento decorre desde 03 de julho no Tribunal Central Criminal de Lisboa e tem sessões agendadas pelo menos até 18 de dezembro de 2025.
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