PARLAMENTO ‘CHUMBA’ AUDIÇÃO DE RESPONSÁVEIS SOBRE EMPRÉSTIMO MILIONÁRIO À VIVA MACAU

Macau, China, 21 jan 2021 (Lusa) — O parlamento de Macau ‘chumbou’ hoje a proposta de dois deputados de audição de responsáveis envolvidos na concessão de um empréstimo milionário à Viva Macau e que ficou por pagar após a companhia área falir.

Os deputados Sulu Sou e José Pereira Coutinho também pediam na Assembleia Legislativa (AL) a entrega de correspondência trocada e atas entre aqueles que estiveram envolvidos no caso, como ex-governantes e outras entidades que participaram na concessão de um empréstimo público que causou um prejuízo ao Governo de Macau de 212 milhões de patacas (cerca de 21,9 milhões de euros).

Os deputados que votaram contra justificaram a posição pelo facto de o Comissariado contra a Corrupção (CCAC) já ter investigado o caso e apresentado as suas conclusões, assim como pelo trabalho já efetuado por uma das comissões.

Sulu Sou e Pereira Coutinho alegaram que muitos dos responsáveis pela concessão do empréstimo, entre eles o ex-chefe do Governo Edmund Ho e o ex-secretário para a Economia e Finanças Francis Tam, nunca chegaram a ser ouvidos durante a investigação do CCAC.

Ambos salientaram a necessidade de serem criados “mecanismos para evitar a concessão de empréstimos quando se verifica insuficiência na fiscalização do erário público ou nepotismo”.

“Por isso mesmo, é necessário conhecer exatamente todo o processo de decisão daquela altura, incluindo as decisões tomadas (…), procedimentos, papéis dos intervenientes”, tanto mais que o CCAC “também não ouviu os sócios e administradores da Viva Macau”, exemplificaram no texto da proposta.

No mesmo documento, recorda-se que Edmund Ho “concedeu diretamente empréstimos a uma empresa de cujo órgão de administração fazia parte um seu familiar (…), o qual detinha também indiretamente ações da mesma, adotando critérios de aprovação e condições de garantia pouco exigentes (…), havendo assim lugar à suspeita de prática de tráfico de interesses”.

“A audição é necessária e legítima”, sustentaram os deputados perante os restantes parlamentares, que acabaram por rejeitar a proposta, por esmagadora maioria.

Até hoje, nenhuma das propostas de audição em plenário da AL foram aprovadas pelos deputados.

Em setembro de 2020, o CCAC divulgou o resultado da investigação sobre o empréstimo à Viva Macau, que faliu em 2010 e não pagou a dívida, afirmando ter encontrado falhas de supervisão, mas não crimes intencionais, de burla ou corrupção.

O caso remonta a 2010, quando em março desse ano a transportadora deixou de operar depois de as autoridades terem anulado a licença por dívidas e cancelamento de voos.

Em novembro do mesmo ano, o executivo de Macau avançou com uma ação judicial contra a companhia aérea para recuperar o empréstimo de 212 milhões de patacas.

O empréstimo à Viva Macau, uma ‘low cost’ de longo curso que operava desde 2006, foi concedido pelo Fundo de Desenvolvimento Industrial e de Comercialização (FDIC) devido às dificuldades financeiras alegadas pela companhia.

O Tribunal Judicial de Base determinou em 2018 o arquivamento do processo de falência por os bens da Viva Macau serem insuficientes para pagar as dívidas e decidiu não “haver necessidade de continuar a venda de ações detidas pela sua avalista”, a Eagle Airways Holdings Limited de Hong Kong.

Para a CCAC, não se apurou que “alguém tivesse violado dolosamente disposições penais nos respetivos processos” e que sócios e administradores da empresa estivessem envolvidos em “burlas, emissão de cheques sem provisão, falência não intencional, frustração de créditos, de favorecimento de credores ou de corrupção ativa”.

A conclusão do CCAC é de que sócios e administradores da empresa “não elaboraram demonstrações financeiras e contas contabilísticas rigorosas relativamente à Viva Macau, podendo esta conduta consubstanciar um crime de falência não intencional”.

No entanto, acrescenta-se no relatório, não só o crime prescreveu, como não existem indícios suficientes “que os restantes atos praticados apresentassem elementos constitutivos dos eventuais correspondentes crimes”.

No mesmo relatório, contudo, o CCAC salientou que “na apreciação e aprovação dos pedidos dos empréstimos da Viva Macau, os respetivos serviços não exigiram a integridade dos documentos de pedido apresentados, nem avaliaram a capacidade de liquidação dos empréstimos do requerente, de forma rigorosa, encontrando-se também falta de rigor na verificação dos requisitos e na supervisão das garantias de liquidação dos empréstimos”.

“Para além disso, o CCAC efetuou também uma análise sobre os atos dos membros do Conselho Administrativo do FDIC e dos trabalhadores da Administração Pública envolvidos nos procedimentos e, face às provas existentes, não se apurou que se verificassem os elementos legais constitutivos dos crimes de corrupção passiva para ato ilícito, de abuso de poder ou de prevaricação”, segundo as autoridades.

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