França aprova lei que reabilita mulheres condenadas por aborto

Paris, 18 dez 2025 (Lusa) – O Parlamento francês aprovou hoje na Assembleia Nacional, definitivamente e por unanimidade, uma lei que reabilita as mulheres condenadas por aborto antes da lei 1975 que legalizou o aborto.

O texto, saudado pelas organizações feministas, reconhece de forma mais ampla que “a aplicação pelo Estado” de leis “penalizando o recurso, a prática, o acesso e a informação sobre o aborto” constitui “um ataque à proteção da saúde, da autonomia sexual e reprodutiva das mulheres” e “aos direitos das mulheres”.

Esta legislação histórica acrescenta que estas leis anteriores a 1975 levaram a “numerosas mortes” e causaram “sofrimento físico e psicológico”.

Apresentado pela ex-ministra dos Direitos das Mulheres, Laurence Rossignol, agora senadora, o projeto de lei socialista foi aprovado por unanimidade no Senado em março, nos mesmos termos e com o apoio do Governo francês.

Esta lei “é um ato de justiça para com as milhares de vidas destruídas por leis injustas”, declarou hoje Aurore Bergé, ministra delegada para a Igualdade de Género de França, referindo-se no seu discurso ao aborto realizado pela sua mãe.

“Temos a responsabilidade de reparar os danos, mas, acima de tudo, temos o dever de sensibilizar”, acrescentou Bergé, referindo-se aos atuais ataques “em todo o mundo” contra os “direitos das mulheres”.

A legislação prevê ainda a criação de uma comissão para reconhecer os danos sofridos pelas mulheres que fizeram abortos, com a missão de contribuir para a “recolha” e “transmissão das memórias” das mulheres forçadas a realizar abortos clandestinos e daquelas que as ajudaram.

Os deputados saudaram a presença na galeria de Claudine Monteil, uma das signatárias do “Manifesto das 343”, uma petição publicada em 1971 na revista semanal Le Nouvel Observateur por 343 mulheres que revelaram ter feito abortos.

O texto, no entanto, não inclui qualquer disposição sobre a indemnização para reparar os danos causados por esta lei.

“Esta questão da indemnização continua a ser um ponto cego neste texto”, criticou a deputada Sandra Regol (Partido Verde).

“Não podemos fingir que esta questão não existe”, acrescentou Regol, uma vez que a Assembleia Nacional aprovou recentemente outro texto contendo reparações para pessoas condenadas no passado por serem homossexuais.

A comissão criada pela legislação poderá realizar inquéritos “para melhor identificar as vítimas” e “talvez, em algum momento, abrir caminho a alguma forma de reparação”, referiu Aurore Bergé.

A aprovação desta legislação ocorre 50 anos após a promulgação da Lei do Véu, que legalizou o aborto.

Entre 1870 e esta despenalização, mais de 11.660 pessoas foram condenadas por terem ou terem realizado um aborto, segundo as estimativas oficiais.

Para as organizações feministas, a aprovação desta lei deverá permitir à França enviar “uma mensagem clara” num contexto internacional “marcado por crescentes ataques ao direito ao aborto”.

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