Discórdia por bandeira palestiniana nas câmaras municipais em França

Paris, 22 set 2025 (Lusa) — Várias câmaras municipais em França hastearam hoje a bandeira palestiniana, para marcar o reconhecimento do Estado da Palestina por parte de Paris, apesar da oposição do ministro do Interior e das primeiras decisões judiciais desfavoráveis.

O Ministério do Interior, que tinha dado instruções aos presidentes da câmara para fazer cessar qualquer hastear de bandeiras, invocando o princípio da neutralidade do serviço público, a não-ingerência na política internacional francesa e o risco de “graves distúrbios” da ordem pública, contabilizava até ao meio-dia 52 autarquias que não tinham respeitado.

O tema do reconhecimento, essencialmente simbólico, da Palestina divide tanto a sociedade como a classe política em França, que presidirá hoje com a Arábia Saudita a uma conferência de alto nível dedicada à solução dos dois Estados, antes do arranque da 80.ª sessão da Assembleia-Geral das Nações Unidas.

O primeiro-secretário dos socialistas, Olivier Faure, instruiu os autarcas do seu partido a hastear a bandeira palestiniana nas câmaras municipais para assinalar o gesto, apelando ainda ao chefe de Estado francês para que “autorize” esta iniciativa.

Em contrapartida, o ministro do Interior demissionário, Bruno Retailleau (do partido de direita Republicanos), ordenou aos presidentes da câmara que recorressem à justiça administrativa sempre que fosse içada uma bandeira, não podendo solicitar às forças de segurança que as retirassem.

Depois de ter manifestado solidariedade com Israel após o ataque sem precedentes do grupo islamita Hamas em Israel em 07 de outubro de 2023, o Presidente francês, Emmanuel Macron, tem-se distanciado, multiplicando as críticas à estratégia do Governo israelita em Gaza e defendendo fortemente a solução de dois Estados nos últimos meses.

No país vive a maior comunidade judaica da Europa Ocidental, com cerca de 500.000 pessoas, assim como uma comunidade árabe-muçulmana muito numerosa, particularmente sensível ao destino dos palestinianos de Gaza.

Hoje, por volta das 09:40 horas (08:40 de Lisboa), foi hasteada uma bandeira palestiniana na fachada da câmara municipal de Saint-Denis, perto de Paris, na presença de Olivier Faure.

“Esta bandeira não é a bandeira do Hamas, é a bandeira de mulheres e homens que também têm direito à liberdade e à autodeterminação”, afirmou o socialista, lamentando que “o ministro do Interior não tenha encontrado melhor [ideia] do que procurar condenar autarcas que cumprem o seu dever de solidariedade”.

Em Malakoff, também nos arredores de Paris, a presidente da câmara comunista antecipara o apelo e colocara a bandeira palestiniana na sexta-feira, mantendo-a no edifício apesar de uma ordem judicial administrativa, na sequência de recurso do presidente de Hauts-de-Seine, que voltou a recorrer à justiça e exige agora uma sanção financeira até à retirada da bandeira.

Mas, em Lille (norte), a bandeira palestiniana que estava hasteada desde meados de setembro, aquando da visita de uma delegação da cidade-irmã Nablus, na Cisjordânia, foi retirada na manhã de hoje e não será reposta, segundo informações da câmara à agência noticiosa France-Presse (AFP).

A questão divide igualmente a esquerda: a câmara municipal de Créteil, a sudeste de Paris, não seguirá o movimento, já que o presidente da câmara, Laurent Cathala (PS), considera que “a primeira das suas responsabilidades deve ser a de preservar a coesão social dentro do município”.

“O Estado não só não pede o hastear, como pede o não-hastear”, insistiu no sábado o Ministério do Interior, posição seguida pelo centro, pela direita e pela extrema-direita.

Vários eleitos e representantes dos Republicanos e da União Nacional (RN, extrema-direita) condenaram firmemente o movimento, pedindo sanções ou criticando uma “manobra comunitarista”.

O reconhecimento do Estado Palestiniano pela França será confirmado com um discurso esta tarde de Macron, durante a conferência internacional, na sede da ONU, em Nova Iorque.

No domingo, a Torre Eiffel projetou as bandeiras palestinianas e israelitas, para apelar à paz.

 

MYCO // JH

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