
Em entrevista ao CMC, José Lourenço fala sobre a adaptação contemporânea do clássico de Goethe
Na passada sexta-feira, 10 de janeiro, o Correio da Manhã Canadá (CMC) teve o prazer de entrevistar o cineasta luso-canadiano José Avelino Gilles Corbett Lourenço, no dia em que o seu filme ‘Young Werther’ foi lançado em todo o Canadá. José Lourenço estreou ‘Young Werther’, a sua primeira longa-metragem, no Festival Internacional de Cinema de Toronto (TIFF) em 2024 e, agora, faz a estreia oficial do filme nas salas de cinema canadianas. ‘Young Werther’, uma reinterpretação contemporânea de ‘The Sorrows of Young Werther’ (‘A Paixão do Jovem Werther’), de Johann Wolfgang von Goethe, transforma a tragédia do século XVIII numa comédia romântica moderna, espirituosa e tocante. O filme conta com um elenco de peso, incluindo Douglas Booth, Alison Pill e Iris Apatow, que dão vida a esta história de amor, amizade e emoções complexas.
Correio da Manhã Canadá: Pode falar-nos um pouco sobre o seu filme ‘Young Werther’?
José Lourenço: ‘Young Werther’ é uma adaptação contemporânea da história de ‘The Sorrows of Young Werther’, um romance de 1774 que teve um enorme impacto em toda a Europa e ressoa há mais de 250 anos. No ano passado, comemorámos o seu 250.º aniversário. No fundo, a história é simples: um jovem e uma jovem apaixonam-se, mas a mulher está noiva de um homem mais velho. No entanto, em vez de se tornar um típico triângulo amoroso, as três personagens desenvolvem uma espécie de amizade peculiar. O filme explora temas como amizade, amor não correspondido, desejo e as emoções complexas que levam as pessoas a tomar decisões que nem sempre são socialmente aceites ou esperadas. Mas, no cerne de tudo, trata-se de pessoas a tentar ser humanas no mundo.
CMC: O que o inspirou a fazer uma adaptação deste romance?
JL: Na verdade, não conhecia o romance enquanto crescia. Fui apresentado à obra na universidade, no meu terceiro ano, e escrevi um ensaio. Depois disso, guardei o livro e não voltei a pensar nele. Muitos anos depois, peguei novamente no romance e percebi que não existia uma grande adaptação em língua inglesa. Na Europa, há muitas versões em diferentes idiomas, incluindo óperas, peças de teatro e até banda desenhada. Mas não havia uma adaptação em inglês. Quis torná-lo contemporâneo porque as personagens são intemporais. Poucas pessoas leriam um livro com 250 anos, então pensei: por que não atualizá-lo?
CMC: Quais foram os desafios que enfrentou ao adaptar a história para os dias de hoje?
JL: O maior desafio foi criar uma ponte entre o mundo moderno e a essência intemporal da história original. Não queríamos apenas modernizar o cenário com portáteis e telemóveis, mas também preservar a riqueza e a textura de um filme de época. O nosso objetivo foi criar uma versão de Toronto que parecesse autêntica e vibrante, mas com um toque de romance e beleza – uma cidade que parecesse elevada, só um pouco. Queríamos manter a magia ao mesmo tempo em que trazíamos a história para o presente.
CMC: A adaptação original inspirou um fenómeno cultural na época. Como espera que ‘Young Werther’ impacte o público de hoje, especialmente os jovens?
JL: O romance teve um impacto enorme na sua época. Foi o primeiro livro a ser comercializado – havia perfumes, roupas inspiradas no estilo de Werther e até estatuetas. Napoleão carregava o livro para a batalha. Estava em toda a parte. Quanto ao nosso filme, não sei se um general vai carregar um Blu-ray dele para uma batalha, mas espero que as pessoas reconheçam as emoções universais no filme – todas as complexidades do amor, da amizade e os desconfortos e confortos que vêm com isso. Espero que os espetadores se vejam na história e se sintam um pouco menos sozinhos enquanto se divertem.
CMC: Filmou em Toronto e Hamilton. Quais as qualidades dessas cidades que mais contribuíram para o seu filme?
JL: Toronto é a minha cidade adotiva. Não nasci em Toronto, mas moro na cidade há 20 anos e pretendo continuar a viver pelo resto da minha vida. É uma cidade linda, romântica, e tenho orgulho de representá-la. Apesar de termos feito algumas filmagens em interiores em Hamilton, a maior parte do filme foi filmada em Toronto. Muitas vezes vemos Toronto no ecrã, mas geralmente disfarçada como outra cidade, como Nova Iorque ou Chicago. O que é frequentemente ignorado são os belos bairros da cidade, a sua arquitetura incrível, a sua comida, música e literatura. Foi um prazer mostrar o verdadeiro espírito de Toronto neste filme.
CMC: O filme estreou no TIFF no ano passado. Como foi recebido pelo público?
JL: Foi incrível estrear o filme no TIFF. O TIFF faz parte da minha vida há 20 anos e foi uma grande honra fazer parte dele. A reação do público foi fantástica. Ouvi muitas histórias maravilhosas sobre como o filme impactou as pessoas. Mas o momento mais especial para mim foi ter os meus pais, a minha mulher e a minha família lá para partilhar essa conquista. Foi uma das melhores noites da minha vida. A minha mãe até me disse: “Esta é a melhor noite da tua vida!” e tive de lembrá-la do meu casamento e do nascimento dos meus filhos. Ainda assim, foi uma noite incrivelmente especial.
CMC: O filme acaba de ser lançado em várias salas de cinema no Canadá. Como se sente em relação a este lançamento e quais são as suas expetativas?
JL: É surreal. Estou muito feliz com o lançamento do filme nos cinemas Cineplex em todo o Canadá. Já foi lançado em vários países, mas há algo muito especial em vê-lo ser lançado em casa. Espero que o filme ressoe com as pessoas. Quero que os espetadores o achem bonito, emocionante e divertido. Espero que se torne um filme que queiram ver repetidamente nos próximos anos.
CMC: Acha que o seu filme vai inspirar as pessoas a lerem o romance original?
JL: Já sei que inspirou algumas pessoas a pegar no romance. Não é uma leitura fácil, mas, seja lendo o livro ou vendo o filme, só espero que as pessoas abracem a história. ‘The Sorrows of Young Werther’ está por aí há 250 anos e espero que a nossa adaptação lhe dê uma nova vida pelos próximos 250 anos.
CMC: Tem algum projeto futuro de que possa falar?
JL: Sim! O meu irmão e eu estamos a desenvolver uma sitcom de meia hora chamada ‘The Confetti Show’, baseada nas nossas vidas na casa dos 20 anos. É a história de dois irmãos que se reencontram depois de viverem separados como adolescentes e enfrentam comportamentos autodestrutivos enquanto tentam amadurecer. Também estou a escrever uma comédia negra sobre ambição, inveja, envelhecimento e assassinato – estou, portanto, muito entusiasmado com isso.
