
Lisboa, 05 dez 2025 (Lusa) — O Banco de Portugal deu hoje a conhecer a versão final das orientações que, a partir de 10 de dezembro, vão regular as novas regras de venda de crédito malparado pelos bancos a entidades não financeiras.
O aviso com as novas diretrizes foi hoje publicado no Boletim Oficial do BdP, podendo ser consultado no site do regulador.
As orientações acompanham a entrada em vigor do novo Regime da Cessão e Gestão de Créditos Bancários, isto é, das regras sobre as operações em que as instituições financeiras vendem carteiras de crédito (em geral malparado) a entidades terceiras que não são entidades financeiras e que não estão autorizadas a conceder crédito.
O novo diploma, criado em setembro pelo decreto-lei n.º 103/2025, transpôs para a legislação portuguesa uma diretiva europeia que deveria ter sido colocada em prática há quase dois anos, até 29 de dezembro de 2023.
As novas regras definem quais são as condições a que um banco tem de obedecer para vender um crédito malparado a uma entidade externa (em geral, a fundos de investimento) e quais são as normas a seguir pelas empresas compradoras e pelos gestores dos créditos que são alienados.
Uma vez que os gestores, para exercerem a atividade, têm de estar registados no Banco de Portugal e passam a ser alvo de fiscalização pelo banco central, o aviso do regulador define quais são os procedimentos a seguir pelos requerentes para pedirem essa autorização.
O texto com as diretrizes divulga o modelo de formulário digital a utilizar e os documentos que os gestores devem submeter para instruir os pedidos junto do BdP.
Do aviso faz igualmente parte informação sobre quais são os elementos a remeter ao BdP pelos gestores de créditos autorizados em Portugal que pretendam exercer as atividades de gestão noutro Estado-Membro da União Europeia.
O texto define ainda quais são os elementos que devem constar do registo público dos gestores dos créditos e qual é o conteúdo das comunicações a enviar pelos gestores se subcontratar atividades de gestão de créditos.
As orientações foram finalizadas pelo BdP depois de o projeto de aviso ter estado em consulta pública entre 17 de setembro e 29 de outubro.
A diretiva na qual se baseia o novo regime das cessões de crédito é de 24 de novembro de 2021. O texto europeu obrigava os países europeus a transporem as novas regras para as legislações nacionais até 29 de dezembro de 2023. No entanto, como Portugal só agora está na fase final do processo legislativo, o Estado português enfrenta um processo de infração aberto pela Comissão Europeia.
Nos últimos anos, incluindo posteriormente à data-limite em que Portugal deveria ter colocado em prática a diretiva, os bancos venderam alguns empréstimos à habitação sem permitir que os proprietários exercessem o chamado “direito de retoma” do contrato (saldar a dívida em atraso, pagar os juros e regressar ao pagamento das prestações).
Com isso, os clientes ficaram impedidos de retomar o crédito, porque, a partir do momento da cessão (da venda), o empréstimo deixou de ser abrangido pelo regime legal que regula os empréstimos à habitação e, consequentemente, os clientes deixaram de poder exercer a retoma prevista na lei, ficando numa situação de maior desproteção e em risco de perder as suas habitações.
Em dois acórdãos semelhantes, um de outubro de 2024 e outro de maio de 2025, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) anulou a venda de duas cessões de crédito por ver “fraude à lei” nas operações realizadas pelo Santander Totta e pelo BPI, por excluírem os clientes daquela proteção legal.
No início de setembro, a Lusa publicou uma reportagem sobre a venda de crédito malparado, altura em que o Banco de Portugal disse à Lusa desconhecer quanto é que os bancos sob a sua alçada de supervisão venderam em empréstimos à habitação desde 2017.
O ano de 2017 é o momento a partir do qual a associação de defesa do consumidor Deco diz terem sido mais visíveis as consequências destas operações.
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