TEATRO DA CORNUCÓPIA FECHOU PORTAS HÁ UM ANO

LusaLisboa, 16 dez (Lusa) — O Teatro da Cornucópia fechou portas há um ano, em 17 de dezembro, com um recital pelo ator e encenador Luís Miguel Cintra, um dos fundadores da companhia, depois de 126 criações, algumas em estreia mundial.

“A Cornucópia acabou, já saímos do sítio, e demos destino a todas as coisas que lá estavam, da maneira que nos foi possível”, disse à Lusa o ator e encenador Luís Miguel Cintra, em tom de ponto final, ao fim de uma saga de 43 anos.

A companhia, fundada por Cintra e pelo encenador e ator Jorge Silva Melo, atual responsável pelos Artistas Unidos, estreou-se a 13 de outubro de 1973, no antigo Teatro Laura Alves, na rua da Palma, em Lisboa. Só em 1975 a companhia passou a “residir” no Teatro do Bairro Alto, (antigo Centro de Amadores de Ballet), na rua Tenente Raul Cascais, onde se manteve, até ao encerramento.

A 17 de dezembro do ano passado, a poesia de Guillaume Apollinaire foi o mote para um recital com o qual Luís Miguel Cintra colocou fim a uma atividade criativa que levou à cena palavras de Shakespeare, Tchekov, Moliére, Genet, Pasolini, Strindberg, Holderlin, Brecht, Garcia Lorca, Gil Vicente, Camões, Almeida Garrett e António José da Silva, entre muitos outros autores.

Uma produção centrada, todavia, na dramaturgia contemporânea “com a intenção de construir um teatro de reflexão com uma função ativa na realidade cultural portuguesa”, segundo a companhia, no seu sítio na Internet.

O Teatro da Cornucópia propôs uma atividade “sempre contra a corrente”, sem “perder algum sentido de intervenção política, de missão pública”, de fazer teatro “para o público e em função do público”, como afirmou Luís Miguel Cintra à agência Lusa em 2013, por ocasião dos 40 anos da Cornucópia.

Já nessa altura, o ator e encenador perspetivava a possibilidade de a companhia encerrar por causa de constrangimentos financeiros, por via dos cortes no financiamento público pela Direção-Geral das Artes.

“Os subsídios estão a limitar a liberdade. [O sistema] é mais limitativo da liberdade do que existir uma censura. (…) Eu não ganho cada vez que duplico funções [ator e encenador], ganho sempre o mesmo e ganho uma miséria”, disse.

Sobre o desfecho da companhia, à Lusa, Cintra afirmou: “O que me fez um bocadinho de impressão foi não se ter conseguido, da parte do Ministério da Cultura, uma vontade de utilizar aquilo que a gente tinha utilizado, durante quarenta e tal anos, e que podia servir de instrumento de trabalho para outras pessoas”.

“Não terem aproveitado tal como a gente o fez. Houve um primeiro interesse que, depois, se esboroou e que não teve realização prática. Gostaria que aquilo que agente fez, a transformação daquilo numa sala de teatro, com muito equipamento lá dentro, tivesse servido, não para uma companhia em especial, mas para quem quisesse”, disse, referindo que “achava que se devia ter aberto um concurso”.

O acervo “valiosíssimo” da Cornucópia, composto, nomeadamente, por livros, cenários, figurinos e arquivo, vai para o Museu Nacional do Teatro e da Dança, em Lisboa, garantiu o ministro da Cultura, Luís Filipe de Castro Mendes.

“Não se trata de uma compra”, esclareceu o governante, “mas sim de uma doação da Cornucópia do seu acervo, em troca de contrapartidas do Estado”, nomeadamente “todas as despesas do encerramento”, incluindo as indeminizações aos funcionários.

À Lusa, Luís Miguel Cintra confirmou que “algumas coisas vão para o Museu do Teatro [e da Dança]”, mas esclareceu que “outras, relacionadas com arquivo, [vão] para o Centro de Estudos de Teatro da Faculdade de Letras [da Universidade de Lisboa]”

“Outras coisas a gente vendeu ou ofereceu, selecionando caso a caso”, e houve ainda outras peças que foram entregues ao Museu do Design, disse Luís Miguel Cintra que partilhou a direção artística da Cornucópia com a cenógrafa Cristina Reis.

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